Choque de credibilidade
Abilio Diniz
Presidente Dilma, que bom que você vetou a lei que permitia enormes descontos e parcelamentos das dívidas dos clubes sem nenhum compromisso deles com uma boa gestão. Seu veto foi um presente para o futebol brasileiro e aponta para uma nova era num esporte tão importante para o nosso país.
Foi uma vitória do bom senso e do Bom Senso F.C. (o movimento dos jogadores criado em 2013 para reformar o futebol) contra a anacrônica bancada da bola, que aprovou em tempo recorde, no final do mandato legislativo, mais um salvo-conduto à má gestão dos nossos clubes.
A punição é um grande aprendizado, sem ela não existe boa gestão. Os gestores dos clubes devem ter responsabilidades e ser responsabilizados quando gastam mal o grande volume de dinheiro que movimentam. Só assim eles se sentirão obrigados a gerir bem e com mais transparência essas organizações. Um perdão fiscal como o aprovado no Congresso, inserido de última hora numa Medida Provisória sobre outro assunto, à revelia de um processo em curso de discussão entre jogadores, clubes e autoridades, seria uma forma de incentivar a continuidade da má gestão do futebol, não de combatê-la.
Fico muito feliz porque o veto presidencial reflete e revigora o desejo de mudança no nosso futebol. Por outro lado, a aprovação da medida pela Câmera e pelo Senado da forma como foi feita mostra que a briga vai ser dura.
A CBF, por exemplo, era contra o veto da presidente e a favor da nova lei. E ainda queria para si a função de criar e fiscalizar as normas que garantiriam o pagamento das dívidas e a boa gestão dos clubes. Mas, infelizmente, a entidade que administra o nosso futebol não mostrou competência para isso e até aqui foi mais parte do problema do que da solução. Por isso, eu acho que são os clubes, uma vez bem geridos e reestruturados, que devem cobrar a CBF, e não o contrário.
O esporte no século 21 traz grandes possibilidades de desenvolvimento social e econômico. Basta ver e aprender com o trabalho de ligas bem sucedidas como as do futebol europeu e as de basquete, beisebol e futebol americano nos EUA. Nosso potencial no futebol (e mesmo em outros esportes) é enorme, mas só se realizará com reformas e firmeza.
Como disse a nota da Presidência, explicando as razões do veto, é preciso formular uma proposta conjunta de todos os envolvidos para estimular a modernização do futebol no Brasil. Uma proposta, diz a nota, que passa pela “responsabilidade fiscal dos clubes e entidades, a transparência e o aprimoramento de sua gestão, bem como a efetividade dos direitos dos atletas”.
É isso aí. A medida vetada por Dilma corria no caminho oposto. Por isso a necessidade do veto. Agora é preciso concluir o processo de amplo diálogo já em curso e aprovar uma proposta que seja boa para todos, menos para aqueles que lucram com o descalabro do futebol no Brasil.
O veto da presidente Dilma revigora esse processo e lhe dá um choque de credibilidade. Como diz o Bom Senso, é preciso tornar o Brasil o verdadeiro país do futebol. E isso só virá com outra mentalidade, outras normas e outra gestão.